quarta-feira, janeiro 22, 2020

Verdade, o que é a verdade?


Com Carlos Brickmann

Como jamais disse o presidente Bolsonaro, mentira é a verdade que ainda não aconteceu, talkey? Mas tem gente exagerando: por exemplo, a turma que que sustenta que o ex-secretário da Cultura Roberto Alvim foi vítima de uma armação da esquerda, que lhe impingiu um texto nazista, que ele desconhecia, só para derrubá-lo. A imaginação voa longe: o Ministério da Cultura passou nas mãos da esquerda desde os tempos de Fernando Henrique (que nas teses imaginárias é mais esquerdista que Mao Tsé-tung) até a queda de Dilma. Deve ter sobrado gente por lá para engrupir o Roberto Alvim, né?
Mas vamos desenvolver o raciocínio: Alvim leu o texto que desconhecia, escolheu por acaso o tema melódico composto pelo músico favorito do alto comando nazista (bom músico, a propósito), fantasiou-se de Goebbels, o ministro da Propaganda de Hitler, e tocou o vídeo, ingenuamente, no ar.
Não é fazer pouco da inteligência de Alvim imaginar esses fatos todos?
Aí, para se vingar, esquerdistas divulgaram texto de Abraham Weintraub, o ministro da Educação, em que ele copiava trecho do próprio Adolf Hitler. Onde Hitler falava em “judeus”, Weintraub falava em “comunistas”. Só que a notícia era falsa. Weintraub fez mesmo o tal discurso (aliás, fraquíssimo). Mas os sites especializados em comprovar ou desmentir notícias fizeram as pesquisas e descobriram que Hitler não falou nem escreveu a bobajeira toda.
Weintraub tem defeitos à vontade. É desnecessário inventar mais um.
De Moro a Moro
O Moro ministro de hoje não é, com certeza, o mesmo Moro que era juiz. O Moro que era juiz disse que não arriscaria sua biografia: ministro que fosse acusado de corrupção, com bons indícios, teria de ser afastado. Ele não iria aceitar conviver com pessoas de cuja honradez duvidasse. O Moro ministro (e que pode até ser candidato a vice ou a presidente) usa frases mais flexíveis, e mostrou seu novo perfil político na entrevista de anteontem na TV Cultura, programa Roda Viva. Claro: convive com o ministro do Turismo, Marcelo Antônio, indiciado pela Polícia Federal e denunciado pelo Ministério Público. E tem mais gente suspeita dando volta no salão. Podendo responder sem responder, fica mais à vontade. Negou, por exemplo, que venha a ser candidato em 2022. Bolsonaro já disse que o quer como vice. E prestígio ele continua tendo: na segunda, houve várias convocações de protestos contra a TV Cultura por entrevistá-lo (entre elas a de Glenn Greenwald, que achava um absurdo não haver ninguém de seu The Intercept entre os convidados. Resultado: três pessoas acusando Moro de “feder”, de ser “sujo” e “covarde”.
Palpite deste colunista: é candidatíssimo. Se conseguir, a presidente.
Reforço inesperado
O Brasil descobriu a fórmula para ser bem ouvido no Fórum Econômico Mundial de Davos, na Suíça: deixou em casa o capitão do time. Quem de fato liderou a delegação brasileira foi o ministro da Economia, Paulo Guedes, bem ouvido pelas demais delegações. Guedes seguiu a linha de Bolsonaro, embora medindo as palavras (“a pobreza é grande causa dos danos ao meio-ambiente”) e mostrando-se otimista: a seu ver, o Brasil pode elevar o Produto Interno Bruto, PIB, neste ano, em 2,5%. Supera as previsões anteriores, de think-tanks brasileiros e estrangeiros, que oscilam em volta de 2%. Guedes disse que, resolvendo problemas que sangravam o Brasil, houve condições para baixar juros e atrair investimentos para grandes privatizações.
Pró e contra
Houve quem contestasse a tese de que a pobreza prejudica o meio-ambiente, mas sem briga: tudo ficou no debate normal, sem polarização. E é mesmo preciso que o Brasil se coloque bem no cenário: normalizando-se as relações entre EUA e China, as exportações brasileiras podem pagar a conta. Guedes fez questão de mostrar que o Brasil está “fazendo a lição de casa”, o que inclui a continuidade das reformas, que teria amplo apoio do Congresso.
Atenção nos americanos
Começou no Senado o processo de impeachment de Trump. Vai escapar.
Caixa preta, preta caixa
O BNDES contratou o Cleary Gottlieb Steen & Hamilton, LLP, pagando 48 milhões de reais. A auditoria investigou oito operações com JBS, Bertin e Eldorado Celulose (também ligada ao JBS) e concluiu, em relatório de oito páginas, que não houve nenhuma evidência direta de corrupção nesses casos.
A Cleary é altamente especializada, e nos casos que investigou não deve mesmo ter achado nada errado. Entretanto, um livro que já vendeu toda a edição, Caixa Preta do BNDES, do repórter Cláudio Tognolli, mostra coisa diferente: como o dinheiro do BNDES irrigou à nossa custa a economia de ditaduras de esquerda latino-americanas e africanas; mostra também como uma empresa originalmente privada, a Tecsis, tão logo começou a perder dinheiro foi passando o controle de sócios privados para o BNDESPar. Hoje a empresa está desativada, endividada, e quem é o acionista maior? Pois é.

Twitter@CarlosBrickmann

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