quinta-feira, setembro 19, 2019

Responsabilidade civil do empregador em atividades de risco com Sérgio Scwartsman


Em recentíssima decisão, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que o empregador tem a obrigação objetiva de indenizar o trabalhador, em caso de acidente de trabalho, nos casos em que a atividade desenvolvida implica risco inerente à essa própria atividade. 
Esse julgamento se deu em repercussão geral, o que significa que a decisão terá de ser seguida por todas as instâncias do Judiciário, mas ressaltamos, para casos semelhantes, ou seja, nos casos de acidente de trabalho em atividades de risco e não em todos os casos, indistintamente.
A chamada responsabilidade objetiva ocorre na situação em que não há a necessidade de se comprovar dolo ou culpa do empregador para que o pagamento seja considerado devido. Basta a ocorrência de acidente de trabalho, em atividade de risco, que nasce a obrigação de indenizar.
O artigo 5º, inciso V da Constituição estabelece que “é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem” (BRASIL, 1988) . Assim, claramente estabelecido que aquele que causar um dano a outrem, deve indenizá-lo, e isso também é válido para o ambiente e as relações de trabalho.
Para Cavalieri Filho (2004, p. 95-96), dano “é o resultado de uma ação ou omissão, não estribada em exercício regular de um direito, em que o agente causa prejuízo ou viola direito de outrem, por culpa ou dolo”.
Essa conceituação vem ao encontro do estabelecido pelo Código Civil (CC), que em seu artigo 186 prevê que “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito” (BRASIL, 2002) e, da previsão do artigo 927, que prevê que “aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo” (BRASIL, 2002).
Contudo, é preciso ressalvar a previsão do parágrafo único do art. 927 do CC, no sentido de que “haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem”.
Pois bem, a discussão há muito existia e vinha se inclinando nesse sentido, ou seja, se o empregador desenvolve uma atividade econômica que traz o risco como inerente, será responsabilizado de forma objetiva, à luz do citado parágrafo único do art. 927 do CC, mas se tratava de decisões de Cortes Inferiores, contudo, agora  se trata de decisão do STF e em tema de repercussão geral, alcançando maior relevância.
Entendemos que para que se caracterize a indenização por danos, faz-se necessário a presença de no mínimo três elementos fundamentais: (i) existência do dano, (ii) a conduta antijurídica do causador do dano e (iii) o nexo causal entre o resultado danoso e a conduta do agente. Na ausência de um deles, não há de se falar em indenização por danos.
Para Cassar (2018, p. 199), dano “é o fato gerador da responsabilidade de pagamento de indenização ou de reparação” e a conduta antijurídica do causador do dano é o chamado ato ilícito, previst no já citado art. 186 Código Civil (BRASIL, 2002) ou ainda aquele conceituado no art. 187 do mesmo Diploma Legal. Assim, será o ato praticado contra as disposições legais ou aquele que, ainda que autorizado ou não proibido por lei, “excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes” (BRASIL, 2002).
Por fim, o nexo causal é a relação de causa e efeito entre a conduta do autor do dano e o próprio dano, de modo que, obrigatoriamente deve haver relação entre o ato ou omissão causada pelo agente e o dano sofrido pela vítima. Sem isso, não há qualquer dever de indenização.
Reputamos a decisão do STF de aplicação da responsabilidade objetiva correta, nos termos do parágrafo único do art. 927 do CC, para os casos de atividade de risco inerente. Porém, reputamos que deve haver uma limitação acerca de quais são essas atividades que traduzem risco inerente em seu desempenho, a fim de conferir segurança jurídica aos envolvidos na relação de trabalho.
Isso porque, por ora, a decisão do STF estende a responsabilidade objetiva a todas as atividades de risco, sem precisamente conceituar quais seriam essas ampliando a gama de empresas em relação às quais se aplica a tese da responsabilidade objetiva. Isso pode tornar o risco do empresário muito alto, a ponto de torar inviável seu negócio.
É que, embora tenha havido tese no sentido de que essa teoria da responsabilidade objetiva deveria ser aplicada apenas às atividades elencadas no art. 193 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), ou seja, para trabalho com explosivos, inflamáveis, sistema elétrico de potência, vigilância pessoal e/ou patrimonial e trabalho com motocicletas, essa tese, por ora, foi vencida, de tal sorte que a tese se aplica a todos os casos de “atividade de risco”.
A esperança é que haja uma reviravolta na fixação desse limite das atividades em que se aplicaria a teoria da responsabilidade objetiva (e apenas em relação a isso, pois a questão da aplicação da teoria objetiva às atividades de risco já está definida), na medida em que foi adiada para essa semana a decisão sobre esse tema, em razão das ausências dos Ministros Celso de Mello e Dias Toffoli que não estavam presentes na sessão. Dessa forma, é possível, na retomada da sessão, haver deliberação para fixação dessa tese de que a responsabilidade objetiva se aplica apenas em relação às atividades capitularas no art. 193 da CLT.
E esperamos que o STF defina exatamente quais são as atividades de risco em relação às quais se aplica a teoria objetiva, a fim de evitar elevação desmedida de novas ações judiciais acerca do tema.
Portanto, que essa questão da responsabilidade objetiva é tema de grande importância para a vida da empresa e do próprio empregado, pois, ocorrendo o dano (acidente de trabalho), independentemente de culpa ou dolo do empregador, haverá a obrigação de indenização, como já pacificado em tema de repercussão geral, pelo STF.  
E a indenização poderá chegar a valores bastante significativos, de acordo com o grau da ofensa e, especialmente, o valor do salário do empregado envolvido na questão – já que é ele que servirá de balizador para fixação da indenização (art. 223-G da CLT).
Assim, os empregadores devem investir na prevenção dos riscos, para evitar a ocorrência de dano/acidente e, portanto, o dever de indenizar

Sérgio Schwartsman, sócio coordenador da área trabalhista do escritório Lopes da Silva & Associados – Sociedade de Advogados, LEXNET São Paulo

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